sábado, 9 de fevereiro de 2008

Jornada de trabalho, direitos e deveres dos Funcionários Públicos

"Jornada de trabalho, direitos e deveres dos Funcionários Públicos"

Olá Amigos, ultimamente têm surgido grandes dúvidas quanto a legitimidade da Administração, em impor horários, extender jornadas de trabalho e alterar atribuições dos funcionários públicos, especificamente, no Estado de São Paulo.
Isto posto, objetivando esclarecer e lançar luz sobre esse conturbado e até certo ponto, desconhecido tema, que têm sucitado discussões e divergências, que aprofundam o debate.
Assim, buscamos divulgar o assunto. Baseado em jurisprudências e nos preceitos administrativos, que visam esclarecer e fazer conhecer do assunto.

Primeiramente, há de se estabelecer dicotomia entre os regimes trabalhista, de natureza contratual, e estatutário, típico do ramo do Direito do Público, no qual o Estado se apresenta em condição de supremacia perante o particular. Dessa supremacia decorre, nos dizeres de Bandeira de Mello¹, “a possibilidade, em favor da Administração, de constituir os privados em obrigações por meio de ato unilateral daquela. Isso implica, outrossim, muitas vezes, o direito de modificar, também unilateralmente, relações já estabelecidas.” Com a derrogação, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, da norma constitucional que determinava a unicidade do regime jurídico dos servidores públicos (CF, art. 37, caput, em sua redação original). Outrossim, convém resgatar alguns ensinamentos constantes de edições anteriores da clássica obra Direito Administrativo Brasileiro, do saudoso e insigne administrativista Helly Lopes Meirelles²:
... “Regime estatutário é o modo pelo qual se estabelecem as relações jurídicas entre o funcionário público e a Administração, com base nos princípios constitucionais pertinentes e nos preceitos legais e regulamentares da entidade estatal a que pertence. Sob esse regime, a situação do funcionário público não é contratual, mas estatutária. Isso significa que o Poder Público – federal, estadual ou municipal – não faz contrato com os funcionários, nem com eles ajusta condições de serviço e remuneração. Ao revés, estabelece unilateralmente, em leis e regulamentos, as condições de exercício das funções públicas; prescreve os deveres e direitos dos funcionários; impõe requisitos de eficiência, capacidade, sanidade, moralidade; fixa e altera vencimentos e tudo o mais que julgar conveniente para a investidura no cargo e desempenho de suas funções. Tais preceitos é que constituem o estatuto em sentido amplo. Pela investidura no cargo os funcionários ficam sujeitos às disposições estatutárias que lhes prescrevem obrigações e lhes reconhecem direitos, mas daí não decorre que a Administração se obrigue para com eles a manter o estatuto vigente ao tempo do ingresso no serviço público. Absolutamente, não. O Poder Público pode, a todo tempo e em qualquer circunstâncias, mudar o estatuto, alterar as condições do serviço público, aumentar ou reduzir vencimentos, direitos ou obrigações dos servidores, desde que não ofenda ao mínimo de garantias que a Constituição lhes assegura (arts. 91 a 111), porque o funcionalismo é meio e não fim da Administração. O fim da Administração é o serviço público para a satisfação do interesse coletivo; o funcionalismo é apenas o instrumento de que se serve para atingir seus objetivos. Por isso o interesse público há de prevalecer sempre sobre o interesse individual dos funcionários. É por essas razões que, no regime estatutário, o servidor não adquire direito à permanência das condições de serviço, do valor da remuneração, à amplitude dos direitos e dos limites das obrigações estabelecidos no estatuto sob o qual foi investido. No interesse do serviço público, aquelas condições e aquele valor podem ser alterados, ainda que em seu prejuízo pessoal; os seus direitos podem ser restringidos e as suas obrigações ampliadas, sem necessidade de sua aquiescência e sem que possa opor-se às modificações unilaterais da Administração. . ..”
Isto posto, As últimas decisões judiciais sobre o tema se harmonizam com os ensinamentos doutrinários recém transcritos. Já no ano de 1951 o Supremo Tribunal Federal decidia (Recurso Extraordinário nº 15.530/BA, DJ 30.08.51, p. 8.104): “- A situação do funcionário perante o Estado não é contratual mas estatutária.Se a mesma Constituição, que não permite à lei prejudicar o direito adquirido, só não faculta a redução de vencimentos no tocante aos magistrados (art. 95 nº III) para o resguardo da “independência de suas funções e conseqüente proteção de seus jurisdicionados, deixou claro que, em regra, são redutíveis por lei os proventos dos demais funcionários públicos, e que, na garantia do direito adquirido, não se compreende a irredutibilidade de tais proventos.” Súmula nº 366 - TST - Res. 129/2005 - DJ 20, 22 e 25.04.2005 - Conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 23 e 326 da SDI-1-Cartão de Ponto - Registro - Horas Extras - Minutos que Antecedem e Sucedem a Jornada de Trabalho-
"Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário do registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. Se ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal". (ex-OJs nº 23 - Inserida em 03.06.1996 e nº 326 - DJ 09.12.2003).
Desde então, a Corte Máxima reiterou inúmeras vezes esta posição de que - “pela natureza estatutária das relações do funcionário público com a Administração, pode tal regime ser modificado por lei, sem que isto ofenda o princípio constitucional de garantia ao direito adquirido” (Recurso Extraordinário n.º 99.592-7/ RJ, RTJ 108, p. 382), tornando a jurisprudência mansa e pacífica.
Especificamente a respeito da elevação da jornada de trabalho, pode-se invocar o acórdão proferido pela Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região nos autos da Apelação Cível n.º 1998.010.00.94274-0/MG (DJ 24.04.2000, p. 72), de cuja ementa consta que:
Observando o limite constitucional, a Administração é livre, por ato normativo, para modificar horário de trabalho, ampliando ou reduzindo a jornada, segundo critérios de conveniência do serviço público, sem que importe a redução da remuneração de seus servidores, a qual não se escalona por jornada fixa ou variável, ou seja, por quantidade de horas trabalhadas, mas pelo padrão de vencimentos e outorga de vantagens previstas em lei”.
Finalmente, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a majoração da jornada de trabalho dos servidores públicos não apenas é lícita como ainda sequer enseja direito a compensação remuneratória. O voto do Ministro Felix Fischer, relator do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n.º 8.072/GO (DJ 25.02.98, p. 94), assim repele a tese:
Quanto à irredutibilidade salarial, não se pode dizer que o princípio restou violado e, para tanto, é necessário perquerir qual o significado da garantia constitucional. Na realidade, o legislador quis levar em conta o valor nominal da remuneração, ou seja, ao interpretar o conteúdo do princípio chega-se a conclusão que a intenção da norma foi evitar redução quantitativa dos ganhos do trabalhador. O funcionário público tem sim, depois do advento da Constituição de 1988, direito adquirido aos vencimentos já incorporados ao seu patrimônio jurídico, entretanto, não pode exigir da Administração Pública que, ao legitimamente tomar medidas para melhor atender aos interesses sociais, seja obrigada a elevar a remuneração a pretexto de atender a norma constitucional que estabelece o princípio de irredutibilidade.”.
Referências:
1 Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, Malheiros Editores,São Paulo: 9ª ed. 1997, p. 30.
2 Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, Editora Revista dos TribunaisLtda., São Paulo: 12ª ed. 1986, pp. 344-346 e 349-350
3 Leonardo Costa Schüler - Consultor Legislativo da Área VIII Administração Pública.
Em suma, o Estado detém poder discricionário para alterar unilateralmente o conjunto de direitos e obrigações, legalmente instituído, a que estão subordinados os ocupantes de cargos públicos, inclusive a jornada de trabalho a cujo cumprimento estão obrigados. Já para os ocupantes de empregos públicos, sempre se haverá de respeitar o convencionado entre as partes, respeitando sempre o direito adquirido.
Isto posto, seria inócuo discutir o assunto, quer no âmbito da justiça, quer no âmbito da administração, pois a matéria é pacífica.
Entretanto, sempre caberá a negociação classista-sindical do assunto, e nessa seara entrariam em cena nossas representações sindicais, pois, em que pese o pacifismo legal do assunto, sobre os papéis desempenhados pelo Estado-Administração e pelos Servidores Públicos Estatutários no contexto, os Servidores Públicos representam “O Meio”, e o Estado-Administração, objetivamente representando “O Serviço Público - é “O Fim” nesta relação da prestação do serviço público aos contribuintes e a coletividade em geral.
Portanto seria lícito afirmar que o Estado-Administração, como responsável pelo “Serviço Público”, é também responsável pelos meios dessa prestação, através do Servidores Públicos, estabelecendo-se aí uma relação patronal, e como tal, deve ser regulada e desempenhada pelo Estado-Administração, na sua qualidade “superior” de empregador - quando detém a legitimidade de regular, ordenar, dispor, e providenciar a investidura e vacância dos cargos públicos em seu âmbito, e os seus "executores" - os Servidores Públicos, pelo exercício das atividades públicas - como Agentes da Administração, para a realização dessa finalidade precípua – “O Serviço Público”.
Assim, o caminho para uma adequação de horários, atribuições, direitos, obrigações e inclusive reivindicação de melhores salários entre o funcionalismo público e o Estado-Administração-Patrão, passa necessariamente e insofismávelmente pela mesa de negociação, através de nossas representações de categoria profissional, para a legítima e insofismável defesa dos interesses de seus membros – “latu sensu” - os Servidores Públicos, e “stricto sensu”, em nosso particular caso - os ASPs e AEVPs.
Abraços
Anselmo P. Ramos

2 comentários:

Unknown disse...

Caro Anselmo em primeiro lugar gostaria de dizer que admiro muito suas sabias palavras e seu caráter.Leio todos os dias a Comunidade de Agentes Penitenciários SP , tenho uma duvida e não sei se é pertinente, se você puder me responder ficarei lisonjeado.Quando você diz que o estagio probatório é de 3 anos (neste período o funcionário tem que ter uma conduta exemplar).Gostaria de voltar ao Caso do promotor Thales Ferri que em 30/12/04 disparou 12 tiros matou um e feriu outro.Ficou 49 dias preso e foi posto em liberdade,alegou Legitima defesa por conta de “suposto gracejos” a sua namorada.Tinha na época 1 ano e três meses de serviço e por decisão do Ministério Publico foi vitaliciado no cargo .Esse vitaliciamento seria uma aposentadoria?Ele nunca mais trabalhou mais continua a receber seus vencimentos.Eu li na Comunidade um Asp foi afastado por acidente de trabalho e ainda não tinha recebido.Tenho tentado reclamar em Instituições de Direitos Humanos,no próprio Ministério Publico e pros políticos.Aonde mais reclamar?
Um grande e fraterno abraço
Fica com Deus

Anselmo Paulo Ramos disse...

Olá Amigo Marco Antonio, saudações!
A vitaliciedade é um benefício capitulado no Artigo 95, Inciso I,para os Juízes, e no Artigo 128,Parágrafo 5°, Inciso I, Alínea "a",para o Ministério Público, ambos, da Constituição da República.
E também em ambos os casos, somente perderão esses cargos mediante decisão de seus membros, do tribunal no caso dos Juízes e Ministério Público no caso dos Promotores Públicos, ou motivada por decisão jucicial transitada em julgado(não cabendo mais apelações).
No caso aludido por você, o referido Promotor Público, ainda não foi julgado, e o mesmo, numa típíca medida corporativa, foi mantido em seu cargo, conforme deliberação de seus pares do Ministério Público, sendo que segundo informações, o aludido Promotor está em gozo de licença médica, fato pelo qual, está percebendo parte de seus salários.
Amigo infelizmente em nosso país, a impunidade é regra e não excessão, e medidas corporativas e protecionistas nas castas funcionais, que também é regra e não excessão, constituíndo uma anomalia que retrata bem a situação do país com os serviços públicos de tão baixa qualidade. A existência de estamentos não hierárquicos, mas composto por castas: o "Baixo clero" representados por 90% do funcionalismo público, nas três esferas de governo, com funcionários desqualificados, mal remunerados e despreparados para a missão pública, e, o "alto clero" representando o restante, composto por castas funcionais e políticas, onde a ocorrência de mazelas como essa comentada por você, e outras vexatórias e de toda sorte, às quais, assistimos diariamente no noticiário.
É triste, Amigo, a impunidade o corporativismo e a hipocrisia que habita os corredores dos órgãos e instituições públicas, ainda mais considerando que tornamo-nos reféns dessa turba, uma vez que as pessoas que poderiam mudar essa realidade - os políticos, são em grande parte os maiores responsáveis por essa situação, que por conveniência não tem qualquer interesse em mudanças, restando ao povo, a indignação, e só...
Quanto à sua indignação, ela é louvável como cidadão consciente, e diante do seu interesse em buscar respeito, ética e moralidade na coisa pública, e relativamente nesse caso, resta-lhe os órgãos de direitos humanos dos bureaus da OEA e ONU, existentes no Brasil, lá você com certeza será ouvido, e quem sabe, a partir dai, alguma providência será tomada.
Abraços
Anselmo

RESULTADOS DOS JOGOS DE HOJE